terça-feira, 20 de julho de 2010

A aluna da Pós-Graduação Delaine escreve artigo em que discute a violência doméstica contra a mulher


DIREITOS HUMANOS DA MULHER


Delaine Oliveira Souto Prates


Chega a ser perturbador escrever sobre os direitos humanos das mulheres num país onde a cada 15 segundos uma mulher é agredida, havendo em grandes casos, exemplos de brutais agressões.
Basta atentarmos aos meios de comunicação e encontraremos lá, escancarados, os casos mais lamentáveis, onde mulheres são mortas das formas mais torpes possíveis, levando-nos a indagar se a culpa seria de sua própria inércia ou do descaso das autoridades competentes.
Desde os primórdios, vivemos em uma sociedade machista, onde a mulher é colocada em posição de inferioridade em relação aos homens, ou seja, em outras palavras, a mulher é historicamente excluída, tendo que batalhar constantemente por seu espaço junto à sociedade, que infelizmente “ainda” a considera como sexo frágil.
Situações como violência doméstica, assédio sexual, discriminação e remuneração desigual no mercado de trabalho, vêm nos acompanhando desde sempre, cujas conquistas por igualdade, às vezes nos coloca em situações conflitantes, de perigo e de desonra.
Mulheres, no Brasil e no mundo, sofrem discriminação e têm seus direitos violados, seja qual for a sua classe social, o que contraria os ditames da nossa Lei Maior, que traz em seu artigo 5º, I, que: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações...”, ou seja, qualquer discriminação em face à mulher, fere o princípio da isonomia e equiparação dos direitos de ambos.
As mulheres devem ser respeitadas! A Constituição Federal prevê que os direitos são iguais, portanto, “abaixo o machismo”!! Chega de mulheres sendo espancadas ou mortas por seus namorados, maridos ou companheiros. Simplesmente, porque se recusou a preparar um almoço ou jantar, porque chegou mais tarde do trabalho ou porque arrumou um trabalho fora de casa, porque se recusou a ter relação sexual quando e como eles queriam, porque se recusou a abortar um filho indesejado por eles (cônjuges), ou ainda, para se eximir de custear prestações alimentícias, o que tem sido muito comum.
As mulheres devem se conscientizar que houve um avanço considerável no ordenamento jurídico brasileiro com a Lei nº 11.340/06, a Lei Maria da Penha, a qual é responsável por criar mecanismos para coibir a violência contra a mulher.
Esta lei representa um marco no enfrentamento da violência contra a mulher. No entanto, ainda há muito a fazer, principalmente, quanto à inércia da própria mulher violentada, em denunciar o seu agressor, sem medo de se expor, levando-o ao banco dos réus, pois, enquanto ela se intimidar, silenciando a constante violência sofrida, a lei não alcançará seu objetivo de coibir, ou seja, de dar um basta à violência contra a mulher.
A Lei nº 11.340/06, surgiu para proteger as mulheres, porém, se faz necessário a conscientização plena das mulheres quanto aos seus direitos para que esta lei não fique apenas no papel. A mulher não deve retratar-se depois de denunciar o seu agressor, pois, na maioria das vezes esse agressor será reincidente após a retratação. E por outro lado, a autoridade policial deve observar com mais cuidados quando recebe uma queixa de uma mulher agredida, para que não ocorra aquela lamentável cena que foi transmitida em rede nacional de uma cabeleireira sendo executada a tiros, a luz do dia, por seu ex cônjuge, mesmo após efetuar denúncia contra o mesmo.
Neste sentido, a lei deve ser aplicada severamente, pois assim, nascerá a esperança de que ao ligar os nossos aparelhos de TV, não mais nos deparemos com casos bárbaros como os que têm chocado o Brasil e o mundo nos últimos dias, sobre a morte estúpida da jovem Elisa Samurdio, desta cabeleireira citada acima, daquela jovem que foi brutalmente assassinada e teve o corpo abandonado em um terreno baldio, da advogada Mércia Nakashima, que morreram, todas, vítimas da violência contra a mulher e na maioria dos casos citados aqui citados, após registrarem ocorrências policias contra seus ex companheiros.
Em um país civilizado, não se admite em hipótese alguma o ditado popular : “em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher”, quando essa briga, ultrapassou os limites da saudável discussão dos cônjuges e desembocou em agressões, que na sua, quase que totalidade das vezes acaba por ter a mulher como vítima, e vítima grave, em razão da desproporção natural da força muscular existente entre homens e mulheres.
O curioso é que no Brasil existe uma prática de criação de leis que nem sempre são aplicadas como deveriam pelas autoridades, sejam elas policiais ou judiciais. No caso da lei intitulada de Lei Maria da Penha, o que se observa é que em boa parte dos casos em que o companheiro finalmente mata sua companheira, ou lhe causa agressões muito graves, a autoridade policial ou até mesmo judicial, já havia sido comunicada dos riscos de ocorrer referidas agressões, mas se manteve inerte.
Dessa forma, acreditamos que há necessidade de se tomar duas grandes medidas no âmbito de melhorar a aplicação da Lei Maria da Penha: a) que as mulheres não se retratem judicialmente, após oferecimento da queixa; b) que os casos em que se apurar descaso do agente policial ou até mesmo da autoridade judicial, ou seja, houve a denúncia pela vítima, mas essas autoridades não tomaram as medidas cabíveis, que nesses casos, seja apurado e punida exemplarmente a autoridade responsável.

7 comentários:

  1. Parabéns pelo Artigo.

    Vou dar minha opinião, que em alguns casos se assemelha com a sua.

    Há várias coisas para serem comentadas.

    Contudo me reservo (em razão do tempo e do espaço destinado aos comentários) a questão da ação penal e a Lei Maria da Penha (LMP)
    Alguns esclarecimentos precisam ser feitos. A LMP não criou crimes, mas tornou mais rigoroso o combate a alguns crimes. Na verdade se trata de violência domestica familiar contra a mulher. Assim, a violência pode ser física, moral, psicológica, sexual (etc), decorrente das relações domésticas (ex: empregada domestica) e/ou integrante da família, contra a mulher, não importando assim se o agressor é do sexo feminino ou masculino (em tese os homens!!). Engraçado é como criamos mecanismo de banalizar o “verdadeiro debate” que gira em torno da lei, ao ponto de dizermos “se chamar minha esposa de gorda foi ser preso” (sic!)... Esse tipo de comentários que banalizam a discussão, mas este é outro debate...
    Caminhamos.

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  2. ATO I

    A lei deixa clara que se aplica a Lei 9.099/95, independentemente da pena (art. 41). Assim não se pode aplicar prestação pecuniária ou multa vicariante. A lei também é clara em dizer que a retratação da representação só é possível perante o juiz, antes do recebimento da denúncia.
    Contudo alguns setores da doutrina, tribunais e a grande maioria dos ministros do STJ entendem que no caso de lesão leve é necessário a representação da vítima decorrentes de violência doméstica, para a propositura da ação penal.
    Segundo o relator Nunes Maia Filho: “Por vezes, isso se dá para proteger a intimidade da vítima em casos que a publicidade do fato delituoso, eventualmente, pode gerar danos morais, sociais e psicológicos”
    Respeito está opnião, mas não concordo. Em outras palavras: posso respeita-la mas nao me peça , pelo menos neste momento de minha construção (somos metamorfoses ambulantes), para adotar este posicionamento. Explico.
    Sempre se sustentou que o crime de lesão corporal leve se processava mediante ação penal pública incondicionada, passando a exigir-se representação da vítima apenas a partir da Lei n. 9.099/95, cuja aplicação foi afastada pelo artigo 41 da Lei n. 11.340/06.

    A meu ver este posicionamento revela a crise do bem jurídico penal no Estado Democrático de Direito.A dogmática jurídica e os tribunais ainda continuam a olhar o novo com os olhos do velho. Este problema é aquilo que o jurista argentino Luiz Alberto Warat chamou de ‘senso comum teórico dos juristas’, ou seja, são verdades e discursos falaciosos produzidos pelos operadores do direito que sustentam toda uma alocução, ausente de cientificidade, sendo apenas manifestação de poder.

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  3. ATO II

    Acreditar que os crimes cometidos sobre o procedimento da Lei 11.340/06 têm como condição de procedibilidade (Fernando da Costa Tourinho) ou condição de punibilidade (Hélio Tornaghi) ação condicionada a representação é incompatível com os documentos internacionais (Carta das Nações Unidas 1945; Declaração Universal dos Direitos Humanos 1948; Convenção Interamericana Sobre a Concessão dos Direitos Civis à Mulher 1948; Convenção sobre os Direitos Políticos da Mulher 1953; Convenção Americana de Direitos Humanos, São José 1969; Convenção Para Eliminar Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher - CEDAW 1979 etc); contra CF e própria lei.
    O artigo 100 do atual Código Penal diz que, em regra, a ação penal será pública incondicionada à representação. Todavia, alguns delitos cometidos contra o próprio ser humano, em sua grande maioria, depende de representação, e alguns são até mesmo de ação penal privada. Vejamos por exemplo o crime de ameaça (art. 147), por abuso de autoridade (art. 2º da Lei 4.898/65). Atenção: não pretendo ser exaustivo!
    Com o advento da Lei 9.099/95, passou o crime de lesão corporal simples e culposo a depender de representação, conforme previsto no artigo 88 da Lei. Pois bem A criminalidade, tanto combatida pelos meios de comunicações (Movimento “Lei e Ordem”) e pelas leis penais, não possui natureza ontológica, passando a ser seletiva, onde o processo de aplicação das normas está intimamente ligado a realidade social, através de um processo conflituoso. Helton Fonseca, em excelente trabalho leciona que:”O novo paradigma concede maior autonomia que o sistema etiológico de reprodução da dogmática formalista, por partir da premissa de que o indivíduo delinqüente é uma pessoa normal e não desviada biologicamente ou socialmente, mas sim selecionada como tal de forma discriminatória, ocasionando o deslocamento do objeto da investigação cientifica (...) FONSECA, Helton. Estratégias Punitivas e Legitimação. Ed. Sergio Fabris Editor. 2005, p.90.

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  4. ATO III

    O legislador possui certa discricionariedade na composição da norma penal, possuindo a capacidade de decidir sobre determinados bens que serão tipificados como crime.

    Ocorre que esta seleção é feita através de um sistema de valores, na qual há uma criminalização de condutas de determinados indivíduos, fomentando assim a seletividade social. Ou seja, os grupos dominantes dizem o que será crime não através de um critério racional e justo, mas a partir da estratificação social, partindo de uma estrutura antagônica na sociedade, onde os detentores do poder punem grupos que estão em um nível inferior. Por outro lado, há uma omissão legislativa para criminalizar condutas específicas dos verdadeiros detentores do poder. Desta analise, seria aparentemente inocente dizer que o sistema penal vem como a destinação de proteger valores considerados importantes, pois na verdade vem garantir a hegemonia política.
    Em razão deste processo ocorre uma estigmatizarão, onde se protege os detentores do poder, e quando há processos, por exemplo, de jovens de classe média alta, terminam apenas com absolvições ou condenações puramente simbólicas.
    Nosso legislador impõe a necessidade de representação para punir alguns crimes cometidos contra a pessoa, reconhecendo a integridade física e mental do ser humano, tornando um bem jurídico disponível, necessitando assim uma autorização para que o Estado possa mover um processo contra a pessoa. Alegam que qualquer ação poderia “ocasionar” um “mau” maior para o ofendido.
    Por outro lado, o direito penal encara o patrimônio, por não depender de representação, como um bem indisponível, de interesse primordial para o Estado, ocasionando todo o aparato judicial e policial na persecução deste crime:
    Em outras palavras: para ‘propriedade’ ação penal incondicionada e para o ‘Ser humano’ (no nosso caso a mulher) condicionada!

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  5. ATO IV

    Lenio Streck:(...) com o Juizado Especial Criminal, o Estado sai cada vez mais das relações sociais. No fundo, institucionalizou, a ‘surra domestica’ com a transformação de delitos de lesões corporais de ação pública incondicionada para a ação pública condicionada. Mais do que isso, a nova Lei dos Juizados permite agora, o ‘duelo nos limites das lesões’, eis que não interfere na contenda entre pessoas, desde que os ferimentos não ultrapassam as lesões leves (que, como se sabe, pelas exigências do art. 129 e seus parágrafos, podem não ser tão leves assim). O Estado assiste de camarote e diz: batam-se que eu não tenho nada com isso! È o neoliberalismo no Direito, agravando a própria crise da denominada ‘teoria do bem jurídico’, própria do modelo liberal-individualista de Direito. STRECK, Lenio Luiz. O senso comum teórico e a violência contra a mulher: desvelando a razão. P. 89

    Entendemos assim que com o advento da Lei Maria da Penha, as lesões corporais de natureza leve (na qual sabemos que não pratica não é tão leve assim) a ação é publica incondicionada.
    Como se sabe a lesão corporal de natureza leve era de ação penal pública incondicionada, e somente com a entrada em vigor do Juizado Especial Criminal passou se a exigir representação da vítima como condição de procedibilidade, autorizando o Ministério Público a oferecer a denúncia. Contudo, como visto acima, a Lei Maria da Penha afastou tal incidência, sendo assim, ação incondicionada. Se assim não fosse todo espírito da lei seria colocado em xeque. Cabe informar ainda que, em regra, toda ação é publica incondicionada. Quando assim não for, a própria lei deixa expresso, conforme se extrai do art. 100 do Código Penal. Ana Paula e Fausto Guimarães ensina que:A Lei não fez expressamente qualquer menção a natureza da ação penal nas infrações que trata [...] induz a conclusão de que tais crimes não mais dependem da vontade das vítimas para seu processamento.
    Outro fato que não pode escapar desta analise é o caso da Lei prever em seu art. 6 (Art. 6o A violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos) que a violência contra mulher é uma forma de violação dos direito do homem. Caso dependa de representação da vítima, é ir contra todos os tratados e convenções internacionais (interpretação sistemática)! Nesse sentido: TJ/DF, SER, 291895, Rel. George Lopes Leite, j. 29.11.2007, DJ. 13.02.2008; TJRS, Ap. Crim. 7000204056484, Rel. Marco Antônio Ribeiro, j, 26.09.2007, Dj. 23.10.2007; TJSP, SER, 01104396, Rel. Juvenal Duarte, j. 06.12.2007

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  7. ATO V


    Refutando o ideário liberal do direito penal a PGR propõe Adin contra a aplicação da Lei 9.099/95 (Soft Crimes ) nos caso de violência domestica.
    Assim resumo as criticas no seguinte quadro:
    • A CF é condição de possibilidade para tudo e ela traça a teoria do bem jurídico (penal), sendo o ser humano elevado a status de maior proteção do Estado. Lembrei-me de Marx, que diz que a o homem não foi feito para a lei e sim a lei feita para o homem;
    • A Criminologia (Critica e Radical) vem denunciado essa seletividade do sistema penal (isso para dizer pouco sobre o assunto);
    • A contradição deste posicionamento se mostra ainda mais incoerente se observarmos que os crimes contra o patrimônio são ações penais incondicionadas;
    • A lei Maria da Pena é clara, conforme vimos nos artigos mencionados;
    • Torna morto o artigo 41 da Lei 11.340/09;
    • “Transforma o juiz em legislador. Não que se pretende reduzir a figura do juiz a mero espectador verdadeiro autônomo na aplicação da lei [...] Seria quase um Direito alternativo às avessas, pois opta por uma interpretação da lei totalmente contrária ao seu espírito”;
    • Esquece os fins sociais do art. 4.


    E isso ai.

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